sexta-feira, 14 de novembro de 2025

VIOLÊNCIA CONTRA AMBIENTALISTAS NO PARÁ: UMA SOMBRA SOBRE A FLORESTA EM TEMPOS DE COP30

Foto: Ascom / PCEPA
Belém (PA) – O Pará, estado amazônico que sediará a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30) em 2025, emerge como epicentro de uma escalada de violência contra defensores ambientais.

Relatórios recentes da Comissão Pastoral da Terra (CPT) e do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) registram 68 ameaças de morte, oito tentativas de assassinato e três homicídios contra ativistas em 2024, além de 35 assassinatos de indígenas entre 2020 e 2024. Esses números, que incluem invasões territoriais, desmatamento ilegal e racismo étnico, expõem a fragilidade da proteção a indígenas, quilombolas, ribeirinhos e agricultores que guardam a floresta contra interesses econômicos vorazes.

A violência não é um fenômeno isolado, mas entrelaçada a disputas fundiárias e crimes ambientais. De acordo com a CPT, 94% das violações registradas em 2023-2024 no estado visam defensores ambientais, com seis assassinatos em dois anos. O Instituto Igarapé aponta que oito em cada dez mulheres ambientalistas na Amazônia Legal já sofreram algum tipo de agressão, incluindo violência moral (27%), física (19,7%) e psicológica (10,8%), frequentemente perpetrada por desconhecidos, parentes ou agentes públicos. No contexto global, o Brasil ocupa o segundo lugar no ranking de letalidade para ambientalistas em 2022, com 34 mortes, segundo a Global Witness, e mais de 1.910 casos na última década.

Casos Recentes que Ilustram o Alarme

O mês de novembro de 2025 trouxe um novo capítulo de tragédia. Em 4 de novembro, as extrativistas Antônia Ferreira dos Santos e Marly Viana Barroso, do Movimento Interestadual de Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), foram encontradas mortas em uma área de babaçu em Novo Repartimento, no sudeste paraense. As vítimas, que coletavam frutos para sustento familiar e preservação da floresta, sofreram cortes profundos no pescoço, com indícios de violência sexual em um dos casos. O crime ocorreu em propriedade privada, onde denúncias apontam derrubada intencional de palmeiras por fazendeiros para plantio de capim – um conflito clássico pelo "Babaçu Livre", que garante acesso comunitário aos babaçuais.

O MIQCB, que representa milhares de mulheres extrativistas, cobra investigação urgente do governo estadual, Ministério Público e Polícia Federal. "Esse crime atinge toda a luta das quebradeiras: uma violência contra o corpo e a história de quem resiste", afirmou o movimento em nota. O deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP), ministro do Desenvolvimento Agrário, manifestou solidariedade e exigiu justiça, destacando o papel das vítimas na preservação da floresta.

Outro incidente chocante ocorreu em 12 de novembro, durante a COP30 em Belém. Manifestantes indígenas e ribeirinhos invadiram a Green Zone, área de eventos paralelos, em um ato de protesto contra a exclusão de povos tradicionais das discussões climáticas. Confrontos com a guarda da ONU resultaram em repressão, com ativistas escorraçados – um episódio que viralizou nas redes, simbolizando a ironia de um fórum global sobre clima marcado por violência local.

Raízes da Violência: Desmatamento e Impunidade

Estudos como o "Cartografias das Violências na Região Amazônica", do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, ligam a letalidade ao crime organizado: 39 comunidades quilombolas no Pará denunciam presença de facções envolvidas em garimpo ilegal e contrabando de madeira. O desmatamento em larga escala, associado a 70% dos ataques globais contra ambientalistas em 2020 (Global Witness), gera "efeitos tardios" de conflito, com invasões prolongadas culminando em assassinatos.

Casos emblemáticos reforçam o ciclo de impunidade. Em 2022, a família de ambientalistas José Gomes (Zé do Lago), Márcia Nunes Lisboa e Joene Lisboa foi executada em São Félix do Xingu por pistoleiros, após anos de defesa de quelônios no rio Xingu. A investigação, sob a Divisão de Homicídios de Marabá, segue sem condenações, apesar de linhas que apontam conflitos fundiários de décadas. A Anistia Internacional e a ONU cobraram apurações, mas o Brasil registra taxa de condenação abaixo de 2% em crimes ambientais, segundo a Global Witness.

Mulheres como Claudelice Santos, que perdeu irmão e cunhada em 2012 em Nova Ipixuna (PA), enfrentam ameaças constantes de madeireiros e garimpeiros. "A violência se multiplica dentro de casa e fora", relata o Igarapé. Em 2025, Miriam Tembé, presidente da Associação Indígena Tembé do Vale do Acará, denunciou falta de resposta federal a pedidos de proteção contra invasões.

Medidas e Desafios: Da Proteção à Hipocrisia

O Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) inclui o maior número de ambientalistas no país, mas críticas apontam seu uso para vigilância política, como na ocupação da Secretaria de Educação em 2025, onde indígenas e parlamentares foram monitorados ilegalmente.

Organizações como Justiça Global e Terra de Direitos repudiam o governo estadual por isso.

Internacionalmente, o príncipe William anunciou, em 5 de novembro de 2025, um fundo para combater a violência contra ambientalistas brasileiros, com assistência jurídica e suporte emergencial a indígenas – uma resposta ao contexto da COP30. No Brasil, o Ministério dos Direitos Humanos e a Funai atuam em operações como a de 12 de novembro, que destruiu garimpos ilegais nas Terras Indígenas Apyterewa e Kayapó, apreendendo escavadeiras e mercúrio.

Contudo, ativistas como Marcio Astrini, do Observatório do Clima, alertam: "A impunidade impulsiona o crime. Sem regularização de territórios – 60% dos quilombolas no Pará sem títulos, per Incra – e ação conjunta contra ilegalidades, a violência persiste." O Escazú Agreement, ratificado pelo México mas não pelo Brasil, poderia fortalecer proteções regionais.

Às vésperas da COP30, o Pará clama por ações concretas: demarcação de terras, fim da impunidade e inclusão real de povos tradicionais. Como disse Bepdjo Mekrãgnotire, líder Kayapó: "Nós lutamos pela floresta para o planeta inteiro." Sem isso, a conferência global arrisca ser mera fachada para um estado em chamas.

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